APOLO E A MORTE DE ASCLÉPIO
Somente uma vez Apolo causará desgosto a seu pai, Zeus. Mas esse desgosto será o maior que o rei dos deuses jamais poderá sofrer.
Tudo começa depois de Apolo se deitar com a mortal Corônis. Embora ela carregue um filho seu, apaixona-se por um príncipe. Ao saber da traição, Apolo mata a mulher e o amante, mas consegue salvar, ainda na barriga da mãe, seu filho Asclépio.
Conforme Asclépio se torna adulto, começam a surgir por todos os cantos do mundo histórias de que ele não só cura os doentes como consegue trazer os mortos de volta à vida. Hades, rei do Tártaro, se irrita com a audácia daquele que rouba almas de seu reino sombrio e envia ao Olimpo uma queixa formal contra o filho de Apolo. Zeus julga correta a indignação de seu irmão e, com o seu raio, sentencia e executa a pena de morte de Asclépio.
Apolo fica desolado com a morte de um filho tão talentoso, e essa desolação se torna ódio cego. Em vingança contra o pai celeste, Apolo leva seu arco e flecha até o Monte Etna e mata os Ciclopes, os seres monstruosos que produzem os raios de Zeus. O crime é tão grave que o rei dos deuses decide mandar Apolo, seu próprio filho, ao Tártaro, o lugar mais temido pelos deuses. Antes de Zeus levar a cabo sua nova sentença, Leto, mãe de Apolo, intervém e clama pela piedade celeste. Com isso, Zeus diminui a pena para um ano de trabalho forçado, e Apolo desce à terra dos mortais para pastorear o rebanho de vacas do rei da Tessália, Admeto.
Por mais indigno que esse trabalho possa parecer para um deus olímpico, Apolo o cumpre com dedicação. É durante esse período que ele conhece Hermes, seu meio-irmão e melhor amigo. No incidente, o rapaz rouba cinquenta das vacas que Apolo pastoreava, mas em troca o presenteia com a lira, cujo som vale mais do que os animais tomados por Hermes. Também é durante sua penitência que Apolo finalmente aprende a humildade. Depois de sua prepotência ter-lhe custado Dafne, seu primeiro amor feminino, Jacinto, seu primeiro amor masculino, e quase tê-lo confinado no Tártaro, o deus da luz passa a sempre pregar a moderação. Desde então, as frases “Conhece-te a ti mesmo” e “Nada em excesso” jamais sairão de seus lábios.
Esse Apolo amadurecido passa a representar a essência dos valores da civilização helenista. Ele incorpora a pureza, a grandeza e a prudência. Sua luz é a luz metafórica, que inspira o coração da mesma forma que o sol ilumina o mundo.
Fonte: "Mitologia", por José Francisco Botelho, Maurício Horta e Salvador Nogueira (2012).
OUTRA VERSÃO:
Não havia donzela mais formosa em toda Tessália do que Corônis. Apolo apaixonou-se por ela e conceberam um filho, mas durante a gestação ela se apaixonou por um mortal, o jovem Ischys. Quando Apolo soube da traição, sentenciou Corônis à morte. No momento em que ela estava sendo colocada sobre a pira para ser queimada, Apolo arrancou do seu ventre o menino ainda vivo. Assim nasceu Asclépio confiado ao centauro Kiron que lhe ensinou a medicina.
Asclépio crescia e com o tempo adquiriu uma grande habilidade na medicina, descobrindo uma maneira de ressuscitar os mortos tornando-se o Deus da medicina. Ele recebeu de Atenas o sangue vertido das veias da Górgona Medusa que continha o violento veneno do lado esquerdo e o sangue do lado direito que era salutar; Asclépio o utilizava para devolver a vida aos mortos.
Asclépio apaixonou-se por Epione, que se tornou deusa da anestesia, aliviando as dores. Tiveram os filhos:
Machaon (cirurgião) e Podaleirus ou Podalirio (o dom do diagnóstico e da psiquiatria) que foram os médicos dos gregos na Guerra de Tróia;
- Telésforo - o pequeno gênio da convalescença,
- Panaceia - a deusa dos medicamentos e ervas medicinais,
- Iaso - deusa da cura,
- Áceso - deusa dos cuidados e enfermagem,
- Aglaea - deusa dos bons fluidos, boa forma e beleza natural, e
- Hígia ou Higeia - deusa da prevenção das doenças, que deu origem ao termo Higiene (limpeza, higiene e saneamento).
Mas a maestria de Asclépio tornou-se perigosamente grande e começou a ressuscitar os mortos. Temendo que Asclépio revertesse a ordem do mundo passando esse conhecimento aos homens, Zeus o matou com um raio. Apolo colocou o seu filho entre as estrelas como a constelação do Serpentário, o Ophiucus e o divinizou. Assim Asclépio é um Deus que não está no Olimpo nem habita o Hades, mas caminha entre os homens ensinando a medicina e aliviando-os das doenças.
Os atributos de Asclépio eram as serpentes enroladas em um bastão, o caduceu, que se transformou no símbolo da medicina. As serpentes eram consagradas a Asclépio, provavelmente devido à superstição de que aqueles animais têm a faculdade de readquirir a juventude, mudando de pele. Também são a sua epifania - a inspiração divina - e está presente espírito dos médicos e profissionais de saúde, estimulando a um conhecimento do corpo humano e também das ervas e drogas.
Havia numerosos oráculos de Asclépio. O mais célebre era o de Epidauro no Peloponeso, onde se desenvolveu uma verdadeira escola de medicina, cujas práticas eram sobretudo mágicas. Os enfermos procuravam respostas e cura para suas enfermidades dormindo no templo. Pelas descricões deduz-se que o tratamento aplicado constituia o que hoje se chama magnetismo animal ou mesmerismo.
O culto a Asclépio, chamado Esculápio pelos romanos, foi introduzido em Roma por ocasião de uma grande epidemia, quando se enviou uma embaixada ao templo de Epidauro para implorar a ajuda do deus. Esculápio mostrou-se propício e, quando o navio voltou, acompanhou-o sob a forma de uma serpente. Chegando ao Tibre a serpente desceu do navio e tomou posse de uma ilha no rio onde foi erguido um templo ao deus. Teve muito prestígio no mundo antigo quando seus santuários converteram-se em sanatórios.
A arte da cura e da medicina era praticada pelos Asclepíades. O mais célebre deles é Hipócrates, (470-377 aC) que nasceu em Kós, fundador da ciência grega da medicina. Para Hipócrates, a moderação é o que proporciona uma vida sã. Quando surge uma doença, é porque a natureza está em desequilíbrio físico ou psíquico. A receita da vida saudável é a moderação, a harmonia: Mens sana in corpore sano - mente sã em um corpo são.
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